sábado, 21 de dezembro de 2019

O boi do presépio e o bolor nas palhinhas



O caso do ‘túnel do Jamor’, como escrevi aqui há uma semana, coloca a nu as fragilidades do futebol português.
SILÊNCIOS E IMAGENS - Treze dias depois do incidente que marcou o jogo da B, SAD com o FC Porto continua a não saber-se exactamente o que se passou. Os silêncios continuam a dominar o ‘caso’. Os protagonistas que as primeiras imagens trouxeram para a ribalta — os treinadores Pedro Ribeiro e Sérgio Conceição —, que podem ter interesses diferentes na revelação de toda a verdade, parecem ter sido engolidos pela estratégia, jurídica e institucional, das respectivas SAD. As imagens que entretanto vieram a público esclarecem muito pouco e fica agora perceptível que só vieram a público por serem praticamente irrelevantes.

IMAGENS SEM SOM - Um ‘pormaior’ a adensar a ideia de que as imagens só vieram para o espaço público exactamente por não conterem nada de muito palpitante, ao ponto de poder agravar ilícitos disciplinares, relaciona-se com o facto de o som relativo às imagens não ter sido disponibilizado. Não quer dizer que obrigatoriamente esclareça tudo o que se passou, mas é óbvio que o áudio da gravação é muito importante para se perceber o contexto em que tudo aconteceu.

PINTO DA COSTA GLOSA - Conhecedor de que as imagens não incriminam o seu treinador, pelo menos de uma forma irrefutável, o presidente do FC Porto, Pinto da Costa, no registo habitual, vem glosar o tema e até com alguma piada, acrescente-se, o que também é nele habitual, conhecedor de que em Portugal os crimes perpetrados no futebol não têm castigo, uma vez que há sempre uma mão invisível que coloca tudo nos seus (in)devidos lugares. Neste caso, o que pode estar em causa é uma infracção que poderia custar a suspensão duradoira de um treinador, o que — guardadas as devidas proporções, comparativamente a outros casos bem mais gravosos para a integridade da competição nacional — não deixa de ter a sua importância.

3-CÂMARAS-3 - A informação que havia dado, na terça-feira, do túnel do Jamor com 3 câmaras confirmou-se. Confirmou-se, de resto, o que havia dito: que as imagens não haviam captado nada de muito relevante. E este é um ponto essencial. Se as câmaras não são colocadas em número e ‘em qualidade’ para, em caso de potenciais ilícitos disciplinares, captarem o que efectivamente se passa nesses espaços, o sistema (de alegada regulação) está viciado. No presépio de Natal, o boi representa a bondade, pelo que está explicado o bolor encontrado nas palhinhas deste caso. Deve ser da humidade.

MENTIRA - E este é apenas mais um (mau) exemplo do faz-de-conta que é o sistema de regulação do futebol em Portugal. Quando são os clubes que aprovam os regulamentos; quando são os clubes que controlam a captação das imagens; quando são os clubes que decidem se disponibilizam ou não as imagens captadas, pagando multas irrisórias se não o fizerem; quando são os clubes — ou as SAD, nas mesmas circunstâncias — que decidem absolver ou enterrar os seus parceiros, consoante os interesses que possam estar em jogo, o futebol transforma-se numa enorme mentira. Nada disto é sério. O sistema de regulação do futebol em Portugal não existe, não é credível, não funciona e fomenta as más práticas dos protagonistas. O descrédito é total e apenas serve para alimentar o ruído, em manifestações de ruminação bovina, própria de países do terceiro mundo.

DESREGULAÇÃO - O futebol vive neste ambiente de desregulação há demasiado tempo, no fundo o mesmo tempo de desregulação em que vive o país. O país e os governantes desculpabilizam as cenas circenses do futebol porque também eles, fora das quatro linhas, alimentam este circo. A salgadização de Portugal colocou-o, sufocado e amordaçado, em nome de mordomias várias, demasiado confortáveis para diversos ‘players’, num plano de consentimento e até de incentivo aos excessos da máquina do futebol. A vieirização de hoje é uma réplica da salgadização de outrora, com repercussões no presente — e sempre com os mesmos a pagarem a factura.  Tóxico, injusto, desmobilizador.

 NOTA DE BOAS FESTAS - Há uns que criam e outros que copiam, diz Jorge Jesus, e com muita razão, neste tempo em que nada de original assume o devido valor. Os copiadores e a profusão de cópias gastas e replicadas são assustadores. Um assessor de comunicação dizia recentemente, esquecendo-se das suas origens e com total desrespeito institucional, que é "…para vocês encherem chouriços’. As cada vez mais complexas manobras de (contra)informação estão a tornar este mundo quase irrespirável. Contudo, não creio que a desistência seja o melhor caminho. Quando, de repente, vemos gente ligada à comunicação a dar opinião e ao mesmo tempo a fazer negócio à custa do êxito de Jorge Jesus, pergunto-me: vale mesmo tudo? Não há — com a permissão de Ferro Rodrigues — um pingo de vergonha?!…

Boas Festas e Feliz Natal!
 

O CACTO  - Alcochete …"nunca mais!"

O futebol em Portugal precisa de uma vassourada das grandes, mas os que podiam fazer a limpeza escondem-se e não estão para se meterem ou em trabalhos ou em apuros. É assim que o sistema definha há anos e se instala o regime do ‘vale tudo’. As recentes notícias a envolverem o nome do Boavista, numa operação em que, segundo a Procuradoria-Geral Distrital do Porto, está em causa «a canalização para sociedade desportiva de quantias monetárias obtidas por sociedade comercial, tudo contornando o circuito tributário através de expedientes diversos», e ainda as também recentes notícias segundo as quais Luís Filipe Vieira foi finalmente ouvido pela PJ — um avanço — no âmbito da ‘operação Lex’, quando estão em causa indícios de corrupção recebimento indevido de vantagem, já pouco perturbam a opinião pública, habituada a não ver resultados mais concretos das investigações, em matéria de condenações a envolver figuras do futebol. Tudo em pleno julgamento de Alcochete; e tudo num momento em que falsos adeptos do Sporting gritam… "Alcochete sempre!" É preciso responder com ‘Alcochete nunca mais!" e perceber se na verdade pouco acontece no futebol, com o saco de Natal cheio de suspeitas, por causa daquilo que diz Rui Pinto, para quem "o Benfica é como um polvo, os braços chegam a todas as elites do país". Rui Pinto diz que "o futebol é intocável". Se não é, parece. Tenha o poder residência habitual no Norte ou no Sul do País.
daqui

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