sábado, 23 de maio de 2020

PEDRO PROENÇA SEM FUGA POSSÍVEL



 Ao longo da minha vida profissional enquanto crítico, vem acontecendo com regularidade antecipar cenários, muitos dos quais se concretizam, como voltou a ocorrer agora com a situação difícil que Pedro Proença está a viver como presidente da Liga, muito acossado e com a cabeça a prémio na AG já aprazada para 9 de Junho.
Na verdade, assinalei há algumas semanas, mais concretamente em 4 de Maio, por força da gestão da crise pandémica que Pedro Proença vinha fazendo, e do mau-estar entretanto gerado, revelando algumas flutuações entre o discurso oficial e o discurso oficioso mantido com os clubes profissionais, que o líder da Liga Portugal "está a cavar a sua própria sepultura" e que "terá muitas dificuldades em seguir como presidente da Liga".

Bem dito, bem feito, como se está a verificar duas semanas depois.

Gerei essa convicção em função de alguns erros cometidos por Pedro Proença que se foram acumulando até perder a confiança de um conjunto significativo de clubes, alguns dos quais alojados em plena direcção, como por exemplo o Benfica e o Sporting.

O maior problema de Pedro Proença, que gera muitas proençadas, quase todas a provocarem efeitos contrários aos seus próprios desígnios e ambições, é querer ser… quem não pode ser.

Nos tempos de Gilberto Madail, por força do errático desempenho federativo, um presidente da Liga poderia ambicionar em ser mais do que uma Rainha de Inglaterra. A FPF entretanto modernizou-se, as selecções nacionais começaram a ganhar mais do que era habitual e a dupla Fernando Gomes/Tiago Craveiro foi conquistando junto do poder político (Governo e Presidência da República) e também nos areópagos internacionais uma base de crédito que antes não tinha.

Mudaram os protagonistas e mudaram as circunstâncias e é bom não esquecer que Proença apareceu na Liga, derrotando Luís Duque em eleições, seis meses depois de ter colocado ponto final na sua carreira de árbitro, sem nenhum lastro entanto dirigente desportivo.

Aliás, como sempre sublinhei, nunca me pareceu um bom princípio um ex-árbitro dirigir os destinos de uma Liga, mas essa é outra conversa e não cabe neste espaço de análise. Um ex-árbitro da qualidade de Pedro Proença deveria ter seguido a carreira no dirigismo da arbitragem, em cujo sector poderia ser muito mais útil…

Um presidente da Liga que se queira dar ao respeito tem de perceber as sensibilidades que existem na sua periferia, mas tem de definir um rumo e uma estratégia. Não pode andar subordinado aos humores, sempre muito oscilantes, dos principais protagonistas da bola indígena, e também não me pareceu um bom princípio recuperar os três emblemas maiores (Benfica, FC Porto e Sporting) para a direcção da Liga.

Pedro Proença quer ser o líder do futebol profissional e, neste processo, lidou muito mal com as ‘ingerências’ da FPF, que foi o interlocutor principal do Governo.

Não foi por acaso que o presidente da Liga foi, inicialmente, deixado para trás na reunião havida em São Bento entre membros do Governo e os três grandes, com a FPF.

Proença juntou-se ‘in extremis’ à comitiva e isso já era um sinal de profunda fragilidade, que deveria ter sido interpretada pelo presidente da Liga. Logo aí deveria ter colocado o lugar à disposição ou demitir-se para ganhar alguma respeitabilidade. Não o fazendo, ficou ainda mais frágil.

O presidente da Liga tem todo o direito em não querer ser a Rainha de Inglaterra e afirmar a sua liderança mas tem de perceber o ambiente que o rodeia e interpretar os sinais, sobretudo quando se está numa crise que coloca em causa a sustentabilidade de todo o edifício do futebol, e não apenas o do profissional.
As cartas que enviou para a presidência da República e para o ministro da Economia, à revelia de qualquer tipo de diálogo, quer com a FPF, quer com os clubes e Direção, ainda por cima sem resposta, denunciam total falta de sensibilidade para compreender o mundo que o rodeia.

E a humilhação de ouvir o presidente da República dizer que ainda não havia recebido a carta e que ela deveria estar nos serviços da presidência?!…

Pensou Proença que ninguém iria saber e seria possível fazer um brilharete?…

... Mas qual brilharete?! A questão do ‘sinal aberto’ corresponde a um tema sensível e até recomendável ser equacionado, mas no tempo certo, isto é, ANTES das dinâmicas de desconfinamento que o Governo foi anunciando.

Numa lógica de confinamento e para não haver a tentação das pessoas saírem de casa, o tema faria até sentido, na perspectiva da defesa da saúde pública e do controlo sanitário.

Houve, de facto, esse momento, quando o futebol se achava como uma das principais excepções ao confinamento – nunca houve percepção pública de que o campeonato não iria ser reatado –, mas enviar uma carta já neste tempo de desconfinamento, com um contrato de patrocínio em vigor (NOS) e em fase de potencial negociação para um novo acordo contratual, é algo absolutamente incompreensível.

Parece até ingenuidade.

O anúncio público da NOS em revelar a não intenção de não renovar esse contrato de patrocínio é uma machadada com efeitos previsíveis: a decapitação do actual presidente da Liga.

Pedro Proença está a ficar sem base de sustentação para prosseguir as suas funções e a demissão do Benfica da direcção da Liga era o passo que faltava para esvaziar e comprometer a sua liderança.

Acredita Pedro Proença que o FC Porto pode ser o pára-quedas que evite uma queda com estrondo, depois de ter sido empurrado do precipício?

Se for isso, e insistir até ao limite na lógica de sobrevivência, ficará com a sua imagem ainda mais comprometida.

Pedro Proença não tem escapatória possível: não é só a contestação de muitos clubes. É a posição da NOS e a indiferença total da Presidência da República, Governo e da própria FPF.

Pedro Proença perdeu o jogo e, se quer manter alguma dignidade, não meta a cabeça na areia.

Há duas semanas que se percebia a crescente fragilização do presidente da Liga. Os erros que se sucederam revelam, mais uma vez, como em tantas outras situações, que não basta querer; é preciso… poder.

O poder que nunca teve e achou ter. E o pouco que tinha… não soube geri-lo.

Game over.
daqui

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