Pressão Alta
Faltam 7 jornadas para o fim da Liga e uma das mais conturbadas épocas do futebol português, aproximam-se as decisões e o pico mais alto das discussões, suspeições, acusações e afins, e num instante as atenções estarão concentradas, felizmente, na participação da Selecção Nacional no Mundial da Rússia, onde Fernando Santos pretende que a equipa das quinas se assuma como uma forte candidata à conquista do Campeonato do Mundo.
Faz sentido este discurso? Portugal tem qualidade suficiente para ser campeão do Mundo? Não é só a qualidade que estará em jogo. São diversos os factores. A 'forma' física dos jogadores em Junho/Julho, o calendário e os adversários a partir do fim da fase de grupos, e outros factores que se conjugarão no momento da competição. Brasil, Argentina, Alemanha e Espanha reúnem favoritismo superior a Portugal, mas hoje a Selecção já se encontra no pelotão da frente, porque a seguir a estes adversários, e estando a Itália fora de prova, não é fácil encontrar uma equipa que, em tese, tenha melhores argumentos técnico-tácticos, sobretudo quando percebemos que Cristiano Ronaldo está, outra vez, em crescendo…
Este 'boom' da Selecção Nacional merece reflexão, e ele vem no seguimento da evolução que a FPF conheceu nos últimos anos.
Ao longo da nossa história, sempre tivemos bons jogadores e boas equipas, mas o dirigismo na Federação teve uma fase completamente amadora, que nos valeu demasiados dissabores. Cometeram-se muitos erros e é bom relembrar algo que muitos protagonistas do futebol português - não todos, evidentemente - gostam de esconder, por razões não totalmente esclarecidas: a mudança de mentalidade competitiva do jogador português, ao nível das formações mais jovens, começou com Carlos Queiroz. Não é que se queira desvalorizar o contributo de treinadores como Pedroto, Peres Bandeira, José Moniz, Jesualdo Ferreira, José Augusto, que foram todos muito importantes, e, ao mesmo tempo, de Juca, Mário Wilson, Otto Glória, Fernando Cabrita, António Morais, Toni, José Torres, Nelo Vingada, Agostinho Oliveira, António Oliveira, Humberto Coelho, Scolari e Paulo Bento, uns muito mais relevantes do que outros, mas foi Carlos Queiroz quem impôs na FPF uma ideia e um projecto de desenvolvimento do futebol português, a partir da sua base, que nunca foi - até hoje - bem compreendido.
Sei do que estou a falar. Entre 1976 e 1991, por força de um interesse especial pelo chamado Futebol Juvenil, privei semana a semana, às vezes dia a dia, em ciclos continuados, com a realidade vivida na FPF. Conheci os protagonistas, as dinâmicas (e até o sótão da FPF, quando ela estava sediada na Praça da Alegria, em Lisboa), os funcionários invisíveis, os treinadores, os jogadores, os dirigentes. Sei - porque vivi a realidade de perto - o que representava a FPF durante 20 anos. A modernidade seguiu-se à mudança de mentalidade. Foi preciso 'partir muita pedra', esvaziar o peso 'caciquista' de algumas associações, reduzir assimetrias organizativas e preencher lacunas infra-estruturais para se chegar ao ponto em que nos encontramos. Na verdade, hoje em dia poucos terão essa noção mas a FPF conheceu um tempo de total descoordenação e de ideia-projecto.
Hoje, a FPF é uma macro-organização profissional. A estabilidade que hoje se vive, decorrente de um maior pulmão financeiro e de uma crescente capacidade competitiva, é um valor precioso. E não é possível nem justo ignorar que essa estabilidade se deve, em grande parte, ao trabalho concertado entre Fernando Gomes, Tiago Craveiro e Fernando Santos. Eles souberam, com diplomacia e eficácia, reduzir os focos de perturbação e trabalhar, transversalmente, não apenas para o sucesso da Selecção A, mas também das Selecções mais jovens e ainda do futsal e do futebol de praia.
É pena que todo este trabalho, que brilhou pouco na Gala das Quinas de Ouro e que voltou a colocar Scolari como uma espécie de 'herói nacional', cujo ambiente chegou a ser demasiado soturno, provavelmente em linha com as dúvidas, as interrogações, as suspeitas e os alegados excessos cometidos na esfera dos clubes, não tenha correspondência na qualidade do nosso campeonato.
A nossa Liga, apesar de este ano estar a revelar uma grande proximidade pontual entre os crónicos candidatos ao título, é desproporcionada em quase tudo, principalmente em receitas e assistências. A FPF tornou-se no Estado Maior do futebol português, evoluiu e modernizou-se (a Cidade do Futebol e tudo o que ela representa são um sinal dessa modernidade), mas parece impotente relativamente a tudo o que se está a passar no âmbito do universo da nossa Liga, na qual os clubes continuam numa luta destrutiva absolutamente inconcebível.
É o que falta a esta Federação: reduzir os poucos focos de inoperacionalidade que ainda abraça nas suas fileiras e conseguir, em situações de alarme como aquela que se vive hoje, ser mais eficaz e actuante, não consentindo situações que ponham em causa a reputação do futebol nacional. E, neste particular, estamos a falar de algo essencial e decisivo para o futuro.JARDIM DAS ESTRELAS
Este 'boom' da Selecção Nacional merece reflexão, e ele vem no seguimento da evolução que a FPF conheceu nos últimos anos.
Ao longo da nossa história, sempre tivemos bons jogadores e boas equipas, mas o dirigismo na Federação teve uma fase completamente amadora, que nos valeu demasiados dissabores. Cometeram-se muitos erros e é bom relembrar algo que muitos protagonistas do futebol português - não todos, evidentemente - gostam de esconder, por razões não totalmente esclarecidas: a mudança de mentalidade competitiva do jogador português, ao nível das formações mais jovens, começou com Carlos Queiroz. Não é que se queira desvalorizar o contributo de treinadores como Pedroto, Peres Bandeira, José Moniz, Jesualdo Ferreira, José Augusto, que foram todos muito importantes, e, ao mesmo tempo, de Juca, Mário Wilson, Otto Glória, Fernando Cabrita, António Morais, Toni, José Torres, Nelo Vingada, Agostinho Oliveira, António Oliveira, Humberto Coelho, Scolari e Paulo Bento, uns muito mais relevantes do que outros, mas foi Carlos Queiroz quem impôs na FPF uma ideia e um projecto de desenvolvimento do futebol português, a partir da sua base, que nunca foi - até hoje - bem compreendido.
Sei do que estou a falar. Entre 1976 e 1991, por força de um interesse especial pelo chamado Futebol Juvenil, privei semana a semana, às vezes dia a dia, em ciclos continuados, com a realidade vivida na FPF. Conheci os protagonistas, as dinâmicas (e até o sótão da FPF, quando ela estava sediada na Praça da Alegria, em Lisboa), os funcionários invisíveis, os treinadores, os jogadores, os dirigentes. Sei - porque vivi a realidade de perto - o que representava a FPF durante 20 anos. A modernidade seguiu-se à mudança de mentalidade. Foi preciso 'partir muita pedra', esvaziar o peso 'caciquista' de algumas associações, reduzir assimetrias organizativas e preencher lacunas infra-estruturais para se chegar ao ponto em que nos encontramos. Na verdade, hoje em dia poucos terão essa noção mas a FPF conheceu um tempo de total descoordenação e de ideia-projecto.
Hoje, a FPF é uma macro-organização profissional. A estabilidade que hoje se vive, decorrente de um maior pulmão financeiro e de uma crescente capacidade competitiva, é um valor precioso. E não é possível nem justo ignorar que essa estabilidade se deve, em grande parte, ao trabalho concertado entre Fernando Gomes, Tiago Craveiro e Fernando Santos. Eles souberam, com diplomacia e eficácia, reduzir os focos de perturbação e trabalhar, transversalmente, não apenas para o sucesso da Selecção A, mas também das Selecções mais jovens e ainda do futsal e do futebol de praia.
É pena que todo este trabalho, que brilhou pouco na Gala das Quinas de Ouro e que voltou a colocar Scolari como uma espécie de 'herói nacional', cujo ambiente chegou a ser demasiado soturno, provavelmente em linha com as dúvidas, as interrogações, as suspeitas e os alegados excessos cometidos na esfera dos clubes, não tenha correspondência na qualidade do nosso campeonato.
A nossa Liga, apesar de este ano estar a revelar uma grande proximidade pontual entre os crónicos candidatos ao título, é desproporcionada em quase tudo, principalmente em receitas e assistências. A FPF tornou-se no Estado Maior do futebol português, evoluiu e modernizou-se (a Cidade do Futebol e tudo o que ela representa são um sinal dessa modernidade), mas parece impotente relativamente a tudo o que se está a passar no âmbito do universo da nossa Liga, na qual os clubes continuam numa luta destrutiva absolutamente inconcebível.
É o que falta a esta Federação: reduzir os poucos focos de inoperacionalidade que ainda abraça nas suas fileiras e conseguir, em situações de alarme como aquela que se vive hoje, ser mais eficaz e actuante, não consentindo situações que ponham em causa a reputação do futebol nacional. E, neste particular, estamos a falar de algo essencial e decisivo para o futuro.JARDIM DAS ESTRELAS
***
'Estrelinha' e… CR!
Portugal não fez uma boa exibição mas alcançou o mais difícil - dar a reviravolta ao marcador, aos 90'+2 e 90'+4 (!).
Gostei (no Portugal-Egipto):
- De C. Ronaldo, pelos 2 golos que marcou no tempo extra;
- De Quaresma, pelas duas assistências para golo;
- De Beto, pela rapidez que demonstrou a sair da baliza, nos primeiros minutos do jogo;
- De Raphaël Guerreiro, pelas iniciativas no corredor esquerdo;
- De André Silva, pela mobilidade no espaço do ponta-de-lança.
Não gostei:
- De Rolando, por ter parecido um elemento estranho à Selecção;
- De Bruno Alves, pelos erros que cometeu;
- De João Moutinho, por lhe ser dado o papel de 'motor' que ele não consegue protagonizar com o ritmo suficiente;
- De Rúben Neves, pela pouca fluidez na 'saída de bola';
- De João Mário, muito preso de movimentos;
- De B. Silva, pela ausência em muitos momentos.
VAR - Excelente!
De resto, nem bom nem mau. Assim-assim.
O CACTO
As borlas e o decoro
Têm vindo a público pormenores sobre pedido de bilhetes, que envolvem várias personalidades, entre as quais políticos de maior ou menor relevância, e o Benfica. Estou convicto de que, se houvesse acesso à realidade que envolve FC Porto e Sporting, neste particular, o corrupio seria provavelmente semelhante ou perto disso. Pela amostra, se vê a falta de um mínimo de decoro. Por que razão se acham estas figuras credoras deste tipo de 'cortesias'? E, quando se fala da ausência 'de retorno' (vide 'Visão' desta semana), bem se percebe o que está em causa. Esta coisa das 'borlas' é uma coisa, infelizmente, muito portuguesinha e o pior é que há gente (comprometida?) a dizer que é tudo normal.
'Estrelinha' e… CR!
Portugal não fez uma boa exibição mas alcançou o mais difícil - dar a reviravolta ao marcador, aos 90'+2 e 90'+4 (!).
Gostei (no Portugal-Egipto):
- De C. Ronaldo, pelos 2 golos que marcou no tempo extra;
- De Quaresma, pelas duas assistências para golo;
- De Beto, pela rapidez que demonstrou a sair da baliza, nos primeiros minutos do jogo;
- De Raphaël Guerreiro, pelas iniciativas no corredor esquerdo;
- De André Silva, pela mobilidade no espaço do ponta-de-lança.
Não gostei:
- De Rolando, por ter parecido um elemento estranho à Selecção;
- De Bruno Alves, pelos erros que cometeu;
- De João Moutinho, por lhe ser dado o papel de 'motor' que ele não consegue protagonizar com o ritmo suficiente;
- De Rúben Neves, pela pouca fluidez na 'saída de bola';
- De João Mário, muito preso de movimentos;
- De B. Silva, pela ausência em muitos momentos.
VAR - Excelente!
De resto, nem bom nem mau. Assim-assim.
O CACTO
As borlas e o decoro
Têm vindo a público pormenores sobre pedido de bilhetes, que envolvem várias personalidades, entre as quais políticos de maior ou menor relevância, e o Benfica. Estou convicto de que, se houvesse acesso à realidade que envolve FC Porto e Sporting, neste particular, o corrupio seria provavelmente semelhante ou perto disso. Pela amostra, se vê a falta de um mínimo de decoro. Por que razão se acham estas figuras credoras deste tipo de 'cortesias'? E, quando se fala da ausência 'de retorno' (vide 'Visão' desta semana), bem se percebe o que está em causa. Esta coisa das 'borlas' é uma coisa, infelizmente, muito portuguesinha e o pior é que há gente (comprometida?) a dizer que é tudo normal.
(Texto escrito com a antiga ortografia)
Artigo de opinião de Rui Santos no Jornal Record
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